quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Só nos dois no salão.. e esta valsa

      A madrugada chega sorrateira, escurecendo cada canto do salão de dança, engolfando os casais num jogo de sombras. A lua se ergue ao seu apogeu, redonda e lasciva, iluminando com sua luz notívaga os olhos das mulheres faceiras.
     Já é tarde, as horas se perdem no ritmo envolvente da Valsa, e morrem na cadência pungente do Tango. Aos poucos, todos vão embora e só nós continuamos rodando no mármore do salão. O único casal, dançando no eco de uma orquestra cansada. Teus olhos desfocados sorriem inocentemente, disfarçando a angústia do teu coração e a fadiga dos teus pés pequenos, trôpegos. Tuas mãos trêmulas tocam meu rosto como tocam uma rosa, apreensiva de encontrar, distraída, um espinho.
     Em meio à fumaça dos cigarros, suspensa no ar, tu me beijas com a culpa de um condenado à morte. Lábios desesperados, peito arfante. "É a valsa que tu ouvias em nosso aposento, enquanto eu te traía ao som de um tango, na despensa."
     Dito isso, ela se desvencilhou de mim, em lágrimas, e em passos rápidos foi embora sem rumo. Nunca mais a vi, nem ouvi seu nome de bocas alheias.
     Vomitei, pedindo ao bandoneon que tocasse "Mano a Mano".


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