sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Ranço

     A aurora que te viu sair é a mesma que te viu sorrir quando da tua chegada sem cerimônia ou alardes. Eu encaro a aurora; nela vejo as cores do teu vestido que se distancia na rua bocejante. São 5:40 da manhã e eu nunca estive de pé a essa hora em dias sóbrios, mas hoje estava completamente desperto. Justo em uma terça-feira tu resolves desertar, mulher. Se fosse no sábado, pelo menos um pouco de whisky poderia lhe oferecer. Hoje, pra beber, só o teu veneno destilado; preciso de gelo pra engolir, já que tu mesma não o faz. É muito fácil ir embora e sentar na calçada e acender um cigarro – do meu maço - e baforar olhando a minha barba por fazer. É fácil ir embora sem arrumar a cama, um disparate deixar-me com o cheiro do teu sexo no quarto onde terei que dormir sozinho. Tratarei de por outra em cima do meu colchão; ou simplesmente trocar o lençol. Nem uma nem outra, eu desço. Desço e olho para os teus olhos para que dos meus não te esqueças. Olharei até que sequem as lágrimas, olharei até que eu não sinta mais nada, até que o transe desfaça tua imagem da minha memória. Mas não. Ele chega e para no meio do caminho, de modo que nós três formamos um triângulo equilátero um tanto transgressor, pois não há igualdade. “Quando ela olha no azul dos teus olhos, amigo, é o castanho dos meus que ela quer encontrar” e esta última palavra minha se confunde com uma risada, que mais tarde vai se confundir com a dor. Mas só mais tarde.


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